Onde está a Igreja ali está o Espírito de Deus

15/06/2014 00:35

(Por Rafael Carvalhaes - Graduado em Filosofia, membro da RCC / Ministério de Formação)

 

    “No dia de Pentecostes, pela efusão do Espírito Santo, a Igreja é manifestada ao mundo. O dom do Espírito inaugura um tempo novo na dispensação do mistério: o tempo da Igreja, durante o qual Cristo manifesta, torna presente e comunica sua obra de salvação”. (CIC 1076)

 

    Ao celebrarmos a Solenidade de Pentecostes, gostaria de refletir sobre a conhecida frase de Santo Irineu, padre da Igreja do século II, em sua obra Adversus haereses, (Cf. 3, 24): “Onde está a Igreja, ali também está o Espírito de Deus”, esta nos reafirma a íntima união da Igreja, Corpo místico de Cristo, e o Espírito Santo de Deus. Mas, de fato, qual a relação da Igreja com o Espírito Santo?

     “Se Cristo é a cabeça da Igreja, o espírito santo é a sua alma”, assim afirmava Leão XIII, na Encíclica Divinum illud munus (1987). É ele, o Espírito Santo, a ação vital que age no Corpo e nos membros do Corpo.

    Queridos, celebramos há poucos dias a grande solenidade de Pentecostes, a Festa da Igreja, a festa da manifestação pública da Igreja para o mundo. Da cruz, ela nasce, e pelo derramamento do Espírito, é capacitada para a missão. Todos nós conhecemos o trecho do livro dos Atos dos Apóstolos, no capítulo segundo e ficamos maravilhados com aquele acontecimento magnífico. Homens e mulheres rudes, simples, humildes, após aquele evento nunca mais serão os mesmos, terão suas vidas transformadas pelo Espírito, e espalhando-se por toda a terra, vão como que tochas vivas incendiando nos homens o fogo do amor de Deus, antes aceso neles naquela sala, o Cenáculo.

    Aqui, se inaugura, de fato, o tempo da Igreja, a Igreja de Cristo, e agora sim, podemos chamá-la mais precisamente desta forma, pois ela deixa de ser simplesmente um grupo fechado e estático e passa a ser uma comunidade aberta e dinâmica, aliás, como é próprio do Espírito Santo. Entretanto, a grande novidade da comunidade primitiva, pós-pentecostes, não é tanto o número de fiéis que a ela será acrescida, mas sim a forte e atuante presença do Espírito de Deus. Percebemos claramente isso na firmeza de Lucas ao escrever nos Atos dos Apóstolos quando diz: “Porque decidimos, o Espírito Santo e nós” (At 15, 28). Nesta resolução dada pelos apóstolos sobre as questões da admissão dos novos vindos do paganismo, vê-se explicitamente que o Espírito fala pela boca dos apóstolos.

    Ao escutarmos esta resolução, fica claro para nós que a ação do Espírito Santo não era de forma alguma um evento isolado, acontecido no dia de Pentecostes, como muitos o querem conceber. Não obstante, Ele é a alma da Igreja, ele a conduz como princípio vital, é uma pessoa presente na vida da comunidade.

    Vive a Igreja, cresce e age no mundo sob o influxo do Espírito Santo, Pentecostes é hoje, agora e sempre na Igreja, Ele jamais deixou de assisti-la, mesmo nos momentos mais cruciais da história da Igreja, Deus sempre suscitara homens e mulheres, cheios da graça para reconduzir a Igreja ao caminho seguro e reto.

    Quando perseguida, é o Espírito quem a sustenta renovando nela a profecia que deverá ser sempre para o mundo e derrama sobre seus fiéis o dom da alegria de sofrer por Cristo, aumenta-lhe o vigor para a missão. A força da Igreja nascente e atual está no deixar-se guiar pelo Espírito, totalmente vinculada a Ele. Esta união produz nela a coragem de nunca desistir.

    Pelo seu testemunho de fé e amor, a Igreja demonstra ao mundo sua origem divina. São Paulo é extremamente feliz ao comparar a Igreja ao corpo humano “embora sendo muitos, formamos um só corpo, porque todos nós comungamos do mesmo pão”(I Cor 10, 17). Como participantes do corpo místico de Cristo, somos enxertados, pelo batismo nesta realidade espiritual. É o Espírito quem promove tal união entre os membros com Cristo cabeça e entre os membros entre si. Onde o Espírito age e os homens não impedem, ele promove sempre a união dos corações e das mentes, suscitando o verdadeiro sentido de fraternidade. “Sede solícitos em conservar a unidade do Espírito no vínculo da paz. Sede um só corpo e um só espírito, assim como fostes chamados pela vossa vocação a uma só esperança” (Ef 4, 3s)

    É Ele quem gera a união no corpo, diz-nos ainda Santo Irineu: “Assim como da farinha não se pode fazer, sem água, nenhum pão, assim também nós, que somos muitos, não nos podíamos tornar um em Cristo Jesus, sem a água que vem do céu” (Adv. Haer. 3, 17, 1). O Espírito não poderá jamais gerar uma “igrejinha” que seja particular, que seja minha e somente minha.

    É Ele quem preserva a Igreja da defecção do pecado, embora ela mesma caminhe com as marcas do pecado de seus membros. Ele não é um hóspede estranho em casa! A Igreja, por excelência, é a casa do Espírito Santo. Ele transforma o grupo de homens fracos em templo santo de Deus, age na Igreja como agia em Cristo.

    O Espírito que habita na Igreja mora também no coração de cada fiel, é ele o dulcis hospes animae. Por isso, um caminho de conversão e santificação, significa, então deixar-se conduzir pelo Espírito. Se é o Espírito a força motora da Igreja, se é Ele quem gera nela a unidade, converter-se significa antes de tudo ser mais Igreja! Muito mais que membros “inscritos” em uma associação, somos pedras vivas neste edifício espiritual (Cf I Pd 2, 5). A Igreja é a comunidade daqueles que querem ser santos, embora sejam pecadores! Daqueles que buscam sua renovação espiritual, de uma vida de oração cada vez mais intensa e de acolhimento ao próximo. “O Espírito é o segredo na nossa santificação” (João Paulo II, Catequese, 11-VII-1998).

    A comunidade de discípulos é aquela que rumina a palavra do Mestre e é o Espírito quem nos faz recordar os ensinamentos que ouvimos. Em Pentecostes, a comunidade de discípulos se torna efetivamente apostólica. Aqui, não quero falar somente no que tange os doze apóstolos, mas de uma comunidade apostólica, ou seja, uma comunidade que sai de si, que é missionária. Em atos, lemos “Pedro, então, levantou-se” (At 2, 14), a Igreja levantou-se e foi proclamar a Jesus Cristo, morto e ressuscitado!

    Por fim, poderíamos nos perguntar: por que onde está a Igreja, ali também está o Espírito de Deus? Por que existe esta implicação entre a Igreja e o Espírito? A resposta é clara e simples! Jesus nunca deixou de ser o ungido. O Espírito que agiu no Cristo e agora age na sua Igreja, sacramento de salvação na face da terra. É o Espírito Santo quem dá continuidade a obra de redenção do homem.

    Encerro esta meditação suplicando ao Senhor a graça de sermos todos nós, eu e você, cada vez mais Igreja, que sejamos como centelhas do Espírito Santo onde quer que estejamos.

    Parafraseando o salmista, sejamos para o mundo uma profecia:

    Oh, mundo, oh, humanidade levantai vossos frontões, elevai-vos bem mais alto antigas mentalidades, culturas, corações duros, a fim de que a Igreja, o Espírito de Deus e sua santa vontade possam aí entrar!